
Publicado dia 17/01/2022
Uma dúvida muito comum a grande maioria dos(as) viúvos(as) é se eles só terão a metade do patrimônio do falecido(a) ou se além da metade, terão também uma parte da herança, junto com os herdeiros, sejam estes seus filhos ou não. Ou seja, ficarão com mais da metade do patrimônio?
E é compreensível a incerteza de como a partilha dos bens devem acontecer, já que atualmente os modelos familiares são os mais diversos possíveis.
Mesmo na estrutura tradicional de pai, mãe e filhos, já temos diferentes resultados na partilha dos bens, pelo fato de que, o regime de casamento apresenta distintas regras de partilha do espólio. Pensando somente neste modelo inicial de família, como exemplo, no qual os filhos são do mesmo pai e mãe, o cenário do regime patrimonial de casamento pode se desdobrar em:
Quando casados civilmente (em cartório):
– Comunhão parcial de bens,
– Comunhão universal de bens,
– Separação total de bens,
– Participação final dos aquestos.
Quando vivendo em união estável, sem casamento no civil (em cartório):
– Sem qualquer pacto nupcial, enquadrasse no regime de comunhão parcial de bens,
– Com pacto nupcial, pode ficar acordado entre as partes a Separação total de bens (o mais comum neste cenário) ou qualquer outro regime dos acima listados.
Seguindo no exemplo, vamos considerar que, a família de 5 pessoas (pai, mãe e 3 filhos) viajando juntos em um carro, sofre um terrível acidente, levando a óbito somente o pai. Vamos considerar também que o casal estava civilmente casados, ou seja, haviam registrado o matrimônio no cartório de registro civil. Vamos definir que este casamento já perdurava por 23 anos, o que resultou nos filhos que estavam com 22, 21 e 20 anos, todos solteiros. Consideremos também que o casal acumulou o seguinte patrimônio nestes 23 anos de sociedade conjugal:
– 2 casas, cada uma no valor de R$ 500.000,00;
– 3 carros, cada um no preço atual de 80.000,00;
– um saldo em conta bancária no montante de R$ 200.000,00; e,
– o saldo de FGTS do falecido de R$ 90.000,00, saldo este acumulado em seus últimos 23 anos de trabalho com carteira assinada na Táxi Aéreo Voado, onde trabalhava como Gerente Operacional de Voo.
Diante deste cenário, qual o valor do quinhão da viúva sobrevivente?
Antes de calcular o montante da viúva, vamos encontrar o valor total do espólio, o que facilmente definimos com uma planilha, conforme o modelo abaixo:
Bem ou direito
Valor
Casa 01 – R$ 500.000,00
Casa 02 – R$ 500.000,00
Carro 01 – R$ 80.000,00
Carro 02 – R$ 80.000,00
Carro 03 – R$ 80.000,00
Saldo em conta bancária – R$ 200.000,00
Saldo de FGTS – R$ 90.000,00
TOTAL DO ESPÓLIO – R$ 1.530.000,00
Após a definição do valor total de todos os bens, o espólio resultou no montante total de R$ 1.530.000,00. A partir deste total, vamos entender o quanto caberia a cada um dos sobreviventes, de acordo com os diferentes regimes patrimoniais de casamento.
Os regimes de bens entre os Cônjuges é estabelecido a partir do art. 1.639 do Código Civil, Lei 10.406/2002. A regra geral é estabelecida pelo art. 1.640, de onde temos que: “Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.”
DO REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS
Entre os arts. 1.658 e 1.666, encontramos as regras para o regime de comunhão parcial de bens. Sendo este o primeiro a ser entendido conforme o exemplo acima, temos que:
De todo o patrimônio deixado pelo de cujus, primeiro deve ser retirado tudo o que está elencado no art. 1.659. Para o nosso exemplo, nada se enquadra aos incisos, haja vista que, tudo foi adquirido na constância do casamento (inciso I do art. 1.660).
Então, se todos os bens são comuns ao casal, 50% de tudo já é de propriedade da esposa que sobreviveu ao acidente, ou seja, já faz parte de seu patrimônio o valor de R$ 765.000,00.
E da metade restante (herança legítima), como deve ser feita a partilha?
Vamos então para o Livro V do Código Civil, que trata Do Direito das Sucessões. É a parti do art. 1.784 que encontraremos a resposta.
Lá no art. 1.845 estão classificados os herdeiros necessários, sendo eles: os descendentes, os ascendentes e o cônjuge. No artigo imediatamente seguinte, o 1.846, fica determinado que: “pertence aos herdeiros necessários, de plano direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima”.
Ficando claro o que é a herança legítima e quem são os herdeiros necessários, podemos então voltar ao art. 1.829 e então calcular em que situação a viúva participará da herança junto com seus filhos, conforme o nosso caso utilizando como exemplo.
Então, o inciso I do art. 1.829 define a seguinte ordem de sucessão da herança legítima:
“I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.”
No nosso exemplo, se o casal estabeleceu no matrimônio o regime de comunhão parcial de bens, a viúva herdará o mesmo percentual que seus filhos, em relação a 50% da herança legítima, ou seja, o que restou depois de ter tirado a metade da viúva que é meeira. Desta forma, resta a seguinte divisão:
DO REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL
As regras deste regime está entre os arts. 1.667 e 1.671.
Neste caso, entra para a meação, todos os bens que o casal já possuía antes do casamento, além dos adquiridos na constância do casamento. Como em nosso exemplo, tudo foi adquirido na constância do casamento, a metade da viúva também resultam em R$ 765.000,00.
E da metade restante, como deve ser feita a partilha?
Agora, estaremos sempre nos orientando pelas instruções do inciso I do art. 1.829 do CC. Sendo assim, para o cenário do casal ter escolhido a comunhão universal de bens, a viúva ficará fora da partilha da herança legítima. Veja como fica o gráfico da divisão.
DO REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQÜESTOS
Este é um cenário bem incomum, pouco utilizado, com suas regras entre os arts. 1.672 e 1.686.
Neste caso, na constância do casamento, cada cônjuge adquire seu patrimônio como se de forma particular fosse, no entanto, no momento da dissolução da sociedade conjugal, seja com o divórcio seja com o falecimento de um deles, cabe a cada um, à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento. Ou seja, divide como se fosse no regime de comunhão parcial de bens.
Para o nosso exemplo, a metade da viúva também resultam em R$ 765.000,00.
E da metade restante, como deve ser feita a partilha? Da mesma forma do regime de comunhão universal de bens. Então, temos o mesmo gráfico.